Quando pensamos em algum tipo de empreendimento importante, seja nos negócios, seja em qualquer outro aspecto da vida, ideias como capacidade, conhecimento e experiência imediatamente surgem como pré-requisitos para um bom desfecho do projeto. No entanto, tudo isso pode significar muito pouco, ou mesmo nada, caso falte um ingrediente fundamental para o bom andamento e o bom êxito de qualquer missão para a qual alguém se proponha: a MOTIVAÇÃO.
A motivação é um elemento tão importante que, sem ela, qualquer projeto torna-se um peso muitas vezes insuportável de se carregar, frequentemente deitando por terra qualquer possibilidade de êxito. Todos sabemos o que é estar motivado, mas também não ignoramos suas nêmesis: a procrastinação e a distração. Pois bem, em ambas as situações, tanto a boa como a ruim, a dopamina está presente e tem papel fundamental. E a boa notícia é que podemos, sim, regular sua ação para obter seus melhores efeitos. Mas, antes disso, vejamos rapidamente o que é a dopamina e seu mecanismo de ação.
O que é dopamina e como ela atua no organismo
A dopamina é um neurotransmissor, ou seja, uma substância química que permite a comunicação entre as células nervosas do cérebro. Ela tem um papel crucial em várias funções importantes, influenciando desde o nosso humor até o controle motor e a sensação de prazer.
Quando você realiza algo que te traz satisfação ou recompensa, como comer algo gostoso ou alcançar um objetivo, o cérebro libera dopamina, criando uma sensação de prazer e bem-estar. Isso faz com que você queira repetir esse comportamento, reforçando o aprendizado e a motivação. Esse ciclo é central no processo de motivação e recompensa.
Além disso, a dopamina está diretamente envolvida no controle motor. Ela ajuda a coordenar os movimentos, e sua deficiência está ligada a doenças como o Parkinson, que causa dificuldades no movimento e rigidez muscular.
Mas a dopamina não age apenas em momentos de prazer; ela também é fundamental na atenção e cognição. Ela ajuda a manter o foco e é vital para tomar decisões, resolver problemas e lembrar informações.
Por outro lado, níveis excessivos ou desequilibrados de dopamina podem ter efeitos negativos, como nos transtornos psiquiátricos. Por exemplo, um excesso de dopamina pode estar relacionado a psicoses, como a esquizofrenia, enquanto uma deficiência pode contribuir para quadros de depressão ou TDAH.
Resumindo: a dopamina é essencial para motivação, prazer, aprendizado, controle motor e funções cognitivas, mas seu equilíbrio é crucial para o bem-estar físico e mental.
Entendendo o ciclo da dopamina. O ciclo bom

Agora que fomos apresentados, é importante entender como se dá sua atuação com relação à motivação, que chamaremos de “ciclo da dopamina”. Imaginemos uma situação prática.
Em seu livro “Seis substâncias para viver bem”, David J. P. Phillips dá o exemplo de um ancestral que viveu há 25 mil anos. Nele, nosso ancestral acorda um dia com fome e se lembra que em determinado lugar há umas frutinhas muito saborosas que poderão lhe saciar a fome. Só de pensar nelas há uma liberação de dopamina em seu cérebro, que lhe dá bastante motivação e foco para agir. E enquanto se mantém na procura, seus níveis de dopamina permanecem altos, bem como sua motivação. Porém, ao chegar a tal lugar, descobre que algum animal chegou antes e não resta mais nada para ele. Decepção. Seus níveis de dopamina desabam, a motivação dando lugar à frustração. Porém é imperativo sobreviver. Nosso ancestral não podia dar-se ao luxo de permanecer na frustração e buscar um bom terapeuta. Quando se trata de sobrevivência, um Plano B é sempre necessário. E eis que ele se lembra de outra fonte de alimento, o que garante mais uma descarga de dopamina e de motivação. Mas agora temos um desfecho feliz, e nosso ancestral finalmente desfruta da refeição tão desejada. Sua dopamina está alta e a sensação é maravilhosa. Tudo está indo maravilhosamente bem até que… tudo isso se acaba. A sensação não é eterna. Nosso ancestral precisa continuar sobrevivendo, então seu cérebro derruba sua dopamina a níveis inferiores aos que tinha antes de encontrar o alimento. Isso vai incentivá-lo a continuar suas tarefas, a buscar alimentos, a caçar animais para se aquecer com suas peles no inverso, a construir e aprimorar seu abrigo, a buscar uma companheira etc. Assim, cada ciclo é sucedido por outro e outro e outros mais.
O lado negro da força

Mas nem tudo são flores. Vivemos em um mundo bem diferente do que viveram nossos ancestrais. Assim como chamamos o exemplo acima de “o ciclo bom”, temos que entender também o ciclo mau. Perceba que o ciclo em si não é bom nem ruim, é simplesmente como funcionamos, e que certas doses de frustração, decepção, desapontamento ou tristeza fazem parte da vida, mas não necessariamente a determinam. Então, onde está de fato o problema? Na maneira como a dopamina é liberada.
Primeiramente, é importante saber que existe um nível basal de dopamina, um estado inicial antes que haja qualquer estímulo. A partir desse nível basal é que se formam os ciclos mencionados. A título de curiosidade, segundo Dra. Anna Lembke, autora do livro “Nação dopamina”, para um rato confinado, o chocolate aumenta em 55% a liberação basal de dopamina no cérebro, o sexo em 100%, a nicotina em 150% e a cocaína em 225%. Porém, a dopamina funciona como uma gangorra que quer sempre permanecer em equilíbrio. Depois que a dopamina sobe, ela não cai apenas até o nível basal, mas vai além. Quanto maior a altura, maior a queda. Aqui entra uma importante diferença explicada por David Phillips a respeito do efeito da dopamina liberada: a dopamina de curta duração e a de longa duração. Uma boa analogia é a do consumo de carboidratos de rápida e de lenta absorção. Enquanto o consumo de doces, pães e massas leva a um rápido aumento dos níveis glicêmicos no sangue seguido de um rápido declínio, o consumo de carboidratos de lenta liberação leva a uma amplitude menor dos níveis de glicose, o que é melhor para o organismo. Do mesmo modo, certas atividades atuam no cérebro causando uma liberação mais lenta e de longa duração da dopamina, o que é bom, enquanto outras tem o efeito contrário. Mas quais seriam as atividades boas e quais as más? Segundo David Phillips, o que desencadeia a boa liberação de dopamina são as atividades e experiências que serão úteis no futuro, aquelas cujos benefícios vão além do imediato. Mais abaixo daremos dicas práticas de como fazer isso, mas antes não podemos esquecer de um problema realmente nefasto relacionado à liberação descontrolada e constante de dopamina: a tolerância.
Sempre que temos boas sensações, queremos que elas continuem, queremos sempre nos sentir bem. Isso é um grande problema quando se trata da simples busca pelo prazer em si, a busca rápida e fácil do prazer. A tolerância é um fenômeno natural, e significa que, para conseguir o mesmo prazer, se necessita de estímulos cada vez maiores. É o drama de quem se vicia em pornografia, quando o prazer que tinha de ver uma foto já não é mais suficiente, e se tem que passar a ver vídeos cada vez mais explícitos. Não existe prazer sempre crescente, e o desequilíbrio sempre cobra o seu preço. Assim como a necessidade de várias fontes de prazer ao mesmo tempo. Assistir a um filme já não é suficiente, quando não há equilíbrio. O filme tem que ser assistido comendo um pacote de batatas fritas, tomando uma cerveja e com algumas pausas para verificar as mensagens do WhatsApp… Ceder aos excessos sempre trará suas consequências.
A vida moderna pode parecer maravilhosa e cheia de recursos e possibilidades, mas tem suas armadilhas. É muito fácil desdenhar de atividades que dão trabalho, que exigem esforço e que não tem recompensa imediata. Hoje as recompensas são fáceis e abundantes. Filmes e seriados, jogar no celular, fast food, salgadinhos, mídias sociais, memes, vídeos aos montes, tudo isso é muito fácil de encontrar e desfrutar. Atividades como ler, estudar, se exercitar e assistir filmes com conteúdo que façam refletir, por sua vez, são atividades que dão trabalho, gastam energia, e por isso são facilmente deixadas de lado.
Também a abundância tem seus problemas. Antigamente, uma ida ao cinema era um acontecimento, e tratava-se de escolher um dos poucos filmes em cartaz. Hoje pode-se passar meia hora somente para buscar algum filme na Netflix que, no fim das contas, nem dará grande prazer por si só. No passado. uma criança aguardava ansiosamente pela chegada do Natal ou do seu aniversário para ganhar algum presente que a deixava com uma alegria enorme. Agradar a uma criança hoje talvez não seja tão fácil assim. De qualquer modo, precisa primeiro tirá-la do celular e do joguinho do momento. Mas a facilidade cobra seu preço.
Então o que fazer? E a parte prática!!!???
Primeiro o que não fazer.
1. Não crie uma cascata de dopamina em seu cérebro. Se juntar vários pequenos rios criará um grande volume de água, que causará um grande impacto quando desabar. Já demos o exemplo de assistir a um filme comendo batatas frias, tomando uma bebida e checando as mensagens no celular. Mas esse é apenas um exemplo das inúmeras situações em que se pode criar uma cascata de dopamina no cérebro. No ambiente de trabalho, realizar uma tarefa ao mesmo tempo em que se pula para a página de notícias, a do Facebook, verificando mensagens no celular e sem esquecer de verificar os e-mails, é péssimo para a produtividade, o que fatalmente gerará frustração.
2. Tome cuidado com os jogos e mídias sociais. Eles são desenvolvidos para desencadear o máximo possível de dopamina no usuário e te manter envolvido o maior tempo possível. Para seus criadores sua dopamina vale dinheiro, via publicidade, compras online ou aumento do volume de usuários, que aumenta o valor dos aplicativos. É claro que não é errado divertir-se um pouco, mas diversão sem limites bem estabelecidos acaba em vício, ou, pelo menos, em um enorme desperdício de tempo em coisas inúteis. No caso das crianças, o efeito é muito mais pernicioso ainda. Os adultos tem o córtex pré-frontal mais desenvolvido, o que significa maior capacidade de pensar racionalmente e maior auto controle. As crianças, não.
3. O mesmo vale para as propagandas. Por trás delas há muita pesquisa e psicologia. Músicas, cores, imagens, desejos, carências, tudo é calculado para provocar o disparo do máximo de dopamina possível.
E o que fazer, então?
1. Dedique-se a uma atividade por vez. Assista ao programa de TV sem distrair-se. Dirija sem olhar o celular. No trabalho, realize uma tarefa de cada vez. Brinque com seus filhos desfrutando o momento, sem outras preocupações. Desligue as notificações. Seu cérebro agradecerá, deixando-o mais animado e descansado. Altas doses de dopamina tiram a vontade de buscar atividades saudáveis onde ela atua de maneira mais constante e estável.
2. Faça um jejum de dopamina e observe seus efeitos. O jejum total de dopamina é impossível. A dopamina sempre está presente e é necessário que esteja. Jejum de dopamina significa retirar, conscientemente, os picos de dopamina de curta duração e as fontes de dopamina ruins. Não queremos dizer que toda fonte de prazer deve ser eliminada e a vida deve ficar sem graça alguma. A palavra-chave aqui é “equilíbrio”. Trata-se de mesclar boas atividades com momentos pontuais de maior prazer imediato, porém evitando acumulações, como já exposto.
3. Tire os exageros. Sofrer de segunda a sexta-feira e querer aproveitar a vida nos dois dias restantes da semana é uma péssima ideia. Assistir a todos os episódios do seriado numa tacada só será prazeroso no começo, mas durará pouco. E no final a dopamina despencará. É como um tipo de “ressaca” que demora a restabelecer o prazer inicial. Deixe a imaginação trabalhar com o pouco que já assistiu. Imaginação é uma coisa boa, e mantém a expectativa para o que virá.
4. Leia boa literatura, estude, aprenda. Talvez esse seja o melhor dos conselhos. Significa limitar as fontes de dopamina, estimular a produção da dopamina de longa duração, eliminar vícios de comportamento e buscar as recompensas de longo prazo. A recompensa de curto prazo, ou seja, o prazer imediato, é evidentemente muito forte e é fácil ceder a ele. Mas sua duração também é muito curta, facilmente caindo na armadilha do “quero mais dopamina agora” para recuperar o prazer perdido. Recompensas de longo prazo são duradouras, e também o bem-estar que delas resultam.
5. Tenha valores e princípios. Sem valores, a vida torna-se um fazer coisas sem sentido, uma busca perpétua do prazer imediato que nunca sacia, uma insatisfação constante que nunca acaba. Uma vida sem bons valores é uma vida vazia, sem inteligência, sem cultura e repleta de vícios. A vida fácil é na verdade muito difícil. Apoiar-se em valores não significa uma vida chata. Significa uma vida equilibrada, mais racional, com as alegrias e tristezas, sucessos e frustrações ocupando seu devido papel e gerando crescimento pessoal. É quando você domina sua dopamina. Ou ela dominará você.